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EU, ELDER F.


Livros, filmes, fotografias e histórias contadas pela metade.

Resenha: 'Que fim levou Juliana Klein?' - Marcos Peres

Ao falar do tempo em sua forma cíclica, Nietzsche sintetiza o conceito filosófico do eterno retorno ao dizer que tudo o que foi um dia voltará. Em "A Gaia Ciência", o filósofo alemão discute sobre como o nosso agir seria influenciado se tivéssemos que viver nossa vida inúmeras vezes, não havendo nessas outras infinitas vivências nada de novo, mas sim cada dor e prazer de antes na mesma sequência, repetidas vezes. O conceito de Nietzsche sobre o tempo circular é o protagonista do romance do maringaense Marcos Peres, "Que fim levou Juliana Klein?", que narra a disputa das famílias Koch e Klein tanto no campo das ideias quanto no âmbito da própria crueldade humana.

O escritor Marcos Peres, ainda que um nome relativamente novo na literatura nacional, estabeleceu-se como um bom contador de histórias já com o seu primeiro romance, "O Evangelho Segundo Hitler", vencedor do Prêmio Sesc de Literatura de 2012. Com o romance "Que fim levou Juliana Klein?", o autor prova mais uma vez a extensão do seu talento ao escrever uma história que, já nas páginas iniciais, desperta a atenção do leitor com as intrigas filosóficas dos Kochs e Kleins. Um pouco decepcionado com a nova leva de escritores brasileiros, deparei-me enfim com um que me fez ajeitar a postura, franzir os cenhos e arrumar bem os óculos para que nada se escondesse de mim nas entrelinhas.

A trama da história gira em torno dos conflitos entre duas famílias de origem alemã, os Koch e os Klein, que, ao alimentar diferentes visões sobre temas como destino e tempo, presenciam o nascer de uma inimizade que se estende até os membros das gerações mais recentes, que acabam se mudando para Curitiba. No Brasil, os integrantes das diferentes famílias se tornam renomados intelectuais e enveredam nos caminhos da docência. De um lado, os Klein reinam absolutos na Universidade Federal do Paraná, enquanto que os Kochs lecionam na Pontifícia Universidade Católica do estado.

Ao intercalar a narração entre os anos de 2005, 2008 e 2011, Marcos Peres presenteia o leitor com a quantidade de drama necessária para fazer com que o mesmo se instigue com os rumos da investigação do detetive Irineu de Freitas, que tenta decifrar os acontecimentos macabros que se sucederam desde o assassinato de uma Koch dentro do Teatro Guaíra, em Curitiba, durante um simpósio de filosofia. E sobre Irineu, é importante destacar o carisma do personagem, que diversas vezes cruza a linha que separa o seu dever como detetive da sua obrigação para com aqueles que prometeu proteger.

Se de um lado é frustrante se encher de expectativa para no fim ser presenteado com frustração, do outro é extremamente bom quando o acaso nos pega de surpresa. Assim ocorreu com "Que fim levou Juliana Klein?", que, ao retratar até onde alguns são capazes de chegar para defender suas convicções, revela o nosso lado mais vil e intolerante. Em uma sociedade repleta de Kleins e Kochs, nos habituamos a guerra das ideologias que por diversas vezes sai das redes sociais, das igrejas, dos congressos e livros para fazerem vítimas reais. Por causa de sua crítica sagaz ao radicalismo das ideias, a obra de Marcos Peres deveria ser leitura obrigatória para intolerantes e extremistas.

Título: Que fim levou Juliana Klein?

Autor: Marcos Peres

Ano: 2015 

Páginas: 352 

Editora: Record

2 comentários:


  1. Beeeeeeeeeeem interessante por parecer fugir da superficialidade que são boa parte das histórias de autores brasileiros que ando lendo recentemente. Você já ouviu falar do Café Filosófico? Passa (ou passava, não sei mais) na TV Cultura e eles tem uns episódios do programa sobre Nietzsche, inclusive deve ter no youtube. Assiste, são bem legais e talvez você goste ainda mais porque alguns dos conceitos debatidos nos programas você já leu no livro, como sobre o eterno retorno.

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    1. Ei, eu conheço o Café Filosófico sim! Inclusive lá que conheci o Flávio Gikovate. Eu vou dar uma buscada no youtube sobre os programas onde o eixo central de discussão foi Nietzsche. Valeu!

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