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EU, ELDER F.


Livros, filmes, fotografias e histórias contadas pela metade.

Resenha: 'Realidades Adaptadas' - Philip K. Dick

No início de 2014, quando estava realizando minha matrícula para o semestre da primavera na State University of New York, decidi sair da minha zona de conforto, números e códigos, e me matriculei em uma disciplina do departamento de Inglês: Literature: Science-Fiction, que, de alguma forma, se conecta com a computação se pensarmos que uma das bases das histórias de ficção-científica é a tecnologia. Entre os autores dos livros leituras obrigatórias da disciplina, estavam H. G. Wells, Kurt Vonnegut, Anthony Burgles, Alfred Bester e, um dos carinhas mais criativos que já tive a chance de ler, Philip K. Dick. 

A obra do Dick debatida em sala foi Ubik, publicado no Brasil pela Editora Aleph e, também, o meu primeiro contato com o autor. A admiração pela ficção produzia por Dick foi tanta que na época decidi escrever o artigo final da disciplina sobre poderes psionicos e o direito à privacide, Psionic Powers and The Right to Privacy According to the Fourth Amendment to the United States Constitution. De volta ao Brasil, conheci o trabalho da Editora Aleph no que tange ficção-científica e adquiri Realidades Adaptadas com a certeza de que seria surpreendido por Dick mais uma vez. 

Nos sete contos reunidos em Realidades Adaptadas, Dick reafirma sua genialidade que na minha cabeça já era verdade absoluta. Os contos são Lembramos para você a preço de atacado, Segunda variedade, Impostor, O relatório minoritário, O pagamento, O homem dourado e Equipe de ajuste. As histórias trazem debates que muitas vezes tive em sala de aula sobre ficção-científica, pois Philip K. Dick nos faz perguntar o que entendemos por realidade e o que, afinal, define um ser humano (acredite, todas as suas respostas poderão ser refutadas e digo isso por experiência própria). 

Em Lembramos para você a preço de atacado, Douglas Quail, um miserável empregado assalariado, sonha como uma viagem a Marte como forma de escapar do marasmo. O seu status financeiro, porém, o impede de realizar os seus anseios e ele resolve contratar os serviços da Rekordar S.A. para que a corporação implante falsas memórias de uma viagem ao planeta Marte em seu cérebro. O enredo do conto, com voltas inesperadas e até engraçadas, serviu de inspiração para o filme O Vingador do Futuro (1990) e a história reforça a criatividade do Dick no campo da ficção-científica.

Já o conto Segunda variedade, publicado em 1953 durante um dos grandes períodos de tensão da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética, ressalta a pretensão humana de "brincar de Deus". Na história, uma tecnologia de destruição é desenvolvida como arma de guerra, mas os seus projetistas esquecem que, em algum momento, máquinas inteligentes podem se virar contra seus criadores. O universo de indefinição entre seres humanos e suas criações deu origem ao filme Screamers (1995).

Em Impostor, Philip K. Dick mistura ficção científica e questões filosóficas instigantes quanto ao que nos faz humanos. O enredo do conto parece relativamente simples: Spence Olham está sob a suspeita de ser um agente secreto duplo e é capturado pela polícia. No campo político, a história ressalta a paranoia presente na Guerra Fria, onde qualquer um poderia ser um enigmo e, nesse contexto, Spence tem que provar sua inocência já descartada pelos oficiais que o capturam. O conto foi virou um filme homônimo em 2001, tendo Gary Sinise no papel de Spence.

No conto O relatório minoritário,  inspiração para o filme "Minority Report - A Nova Lei", John Anderton é o fundador e chefe da Divisão Pré-Crime, uma divisão que impede a ocorrência de crimes que acontecerão no futuro através de humanos dotados de precognição. No dia em que um novo assistente entra na divisão, Anderton recebe um relatório indicando que ele, o chefe da divisão, irá cometer um assassinato. A história evidentemente se baseia nos paradoxos envolvendo precognição: se alguém pode ver o futuro, então o futuro pode ser alterado? Se sim, o que isso diz de fato sobre a capacidade de precognição?

Na mesma linha envolvendo elementos do futuro, em O pagamento Jennings é um engenheiro que concorda em trabalhar por dois anos para Construtora Rethrick e depois ter sua memória apagada para proteger segredos da empresa. Em vez de receber o dinheiro prometido no final do seu contrato, Jennings descobre que pediu para ser pago com uma coleção de itens estranhos antes de ter sua memória apagada: uma chave codificada, um canhoto de passagem, etc. Em suma, a história mostra como um indivíduo pode assumir o controle de sua vida e se tornar o seu próprio deus ex machina.

A história de O homem dourado traz à tona discussões envolvendo mutantes, pois na história um agente do governo tem a missão de rastrear mutantes e esterilizá-los ou até mesmo matá-los, pois teoricamente eles são uma ameaça aos humanos. O homem dourado em questão é o jovem Cris, que consegue não apenas ver o futuro mas também seduzir mulheres com seu aspecto dourado. O próprio autor apresentou uma análise sobre "O homem dourado", onde ele afirma que quando escreveu o conto ele defendia a ideia de que mutantes poderiam não ser tão bondosos.

Em Equipe de ajuste, o Setor T137 está sendo preparado para ser ajustado e os responsáveis pelo ajuste precisam se certificar de que o corretor de imóveis Ed Fletcher esteja dentro do setor durante o processo. No entanto, uma série de eventos faz com que ele se atrase, o que resulta em Fletcher entrando em um mundo em cinzas que ele julga ser uma alucinação. Na verdade, ele não sabe que a existência humana é resultado de ações de entidades que manipulam o tempo. O conto, que deu origem ao filme Os Agentes do Destinos, traz questionamentos a cerca da nossa relação com o todo no universo.

A partir da leitura dos contos, é difícil não perceber a grande influência que a Guerra Fria teve nos trabalhos do Philip K. Dick. A conformidade presente nessa época, a manipulação da informação, os personagens e os costumes refletem em suas histórias com agentes secretos e cenários pós-apocalípticos. Na ficção-científica, que dentro da literatura é considerada o gênero das ideias, Dick criou universos diferentes que às vezes se cruzavam em outras de suas histórias e, também, influenciou outros escritores do gênero. Mais conhecido por causa dos filmes baseados em suas obras do que por sua literatura, Dick é considerado hoje um dos grandes mestres da ficção-científica.

Título: Realidades Adaptadas

Autor: Philip K. Dick

Ano: 2012

Páginas: 304

Editora: Aleph



11 comentários:


  1. Gostei bastante da sua resenha, apesar de nao ser um livro que me anima muito a ler fiquei bem curiosa. Vou pesquisar mais sobre o livros quem sabe um dia eu nao leia ele ne ;).

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  2. Oi, já ouvir fala desse livro sempre fico curioso, acho que é o tipo de livro que eu ia gostar, adorei a resenha.
    Abraços
    litaralmentelivros.blogspot.com.br

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  3. gnt, amei a resenha! Perguntinha: Esse contos tem um "Q" distópico, né?

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  4. Bem psicológico...adoro!
    E quando é dividido e contos então, melhor ainda.
    Abraços.

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  5. Primeiro preciso dizer que fiquei até tonto olhando para essa capa, hahaha!
    Adorei sua resenha, mas infelizmente esse não é o tipo de livro que me agradaria.

    Abraços
    http://ummundochamadolivros.blogspot.com.br/2015/07/li-ate-pagina-100-enfeiticadas.html

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  6. Olá, tudo bem??

    Adorei a sua resenha! Gosto muito de ficção científica e de todo o universo que é criado que um dia pode realmente existir... Amei o livro! Já anotei o nome pra adicionar a minha lista de desejados... Afinal, amo contos. Ele deve ser uma grande influência mesmo com um livro tão bom.

    XOXO
    Umnovo-roteiro.blogspot.com

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  7. Amei sua resenha! O livro parece ótimo, mas bem diferente do estilo que estou habituada a ler. Seria uma boa escolha pra eu fugir da rotino.

    Beijos,
    Gabi - vidadebookaholic.com

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  8. Quando saimos da nossa zona de conforto e a experiencia é boa, não existe nada mais gratificante. Eu tive uma experiencia assim um ano atrás quando comecei a ler Literatura Brasileira Contemporânea, a experiencia foi tão agradavel que me apaixonei hahha. Eu nunca li ficção-cientifica, no entanto, a capa desse livro , a narrativa, e a sua resenha me deixaram bastante curiosa , agora estou em duvida se arrisco ou não sair da minha zona de segurança mais uma vez hahaha.

    Beijos , Anna

    www.amigadaleitora.com

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  9. Uau! Simplesmente adorei! Eu estou escrevendo uma série de ficção científica, estou no segundo livro, uma mistura de mutantes com criação, inserção, desligamento e religamento de memória. Seria ótimo ler esse livro.

    Eu assisti a quase todos os filmes correspondentes aos contos. O Pagamento também tem versão para o cinema. É um filme muito legal. Há uma máquina que prevê o futuro - como ele era ligado nisso! Um gênio, concordo.

    Beijos,

    Isie.

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  10. Eu até gosto dessa temática mas acho que no momento não seria algo que me animaria muito, acredito que estou com uma ressa literária daquelas esse dias. Porém vou anotar a dica e lê-lo quando tiver a oportunidade. Adorei essa capa xD

    xoxo
    http://www.amigadaleitora.com/

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  11. Olá!
    Eu não conhecia o autor e nem o livro.
    Parece ser um livro muito bom, com histórias interessantes. Apesar de não ser o gênero que costumo ler, acho que leria ele sem problemas.
    Adorei a resenha.
    Beijinhos!
    http://eraumavezolivro.blogspot.com.br/

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